domingo, 5 de maio de 2013

A AVENIDA FALECIDA





(R.Angelo)

Ó Avenida Fernandes Lima! – Terei de gritar mais uma vez, para que ouça em tua tumba?


És cartão postal? Ou será que em tudo és quase? Pseudo avenida também?  Quantos casais deixarão de se conhecer no seu passeio público desnivelado? Quantas fotos deixaram de ser tirada em tua passarela a mão armada?


Cartão postal... Não és, pois nem para isso tens vocação na tua apática retidão.


Não podes Avenida Fernandes Lima reclamar que somos alheios a ti, ser empedernido que insiste em travar nossas vidas. Saibas que és sem graça, mas seria por opção? Não, não fiques brava exalando calor de tuas faces e terror de teus galhos secos. Calor. Tu tens isso e uma vocação desperdiçada, mesmo os que em ti fincam morada são amaldiçoados com sua inhaca de cadáver. És um natimorto Avenida Fernandes Lima. Batizaram-te pelas costas com esse nome de coronel. Como redenção, no dia de teu batismo, merecias um gaiato típico dos nossos, gritar no meio da multidão: “Coloca Avenida carniça!”. Calma, calma, você não fede Fernandes Lima, nem isso o teu homônimo cadáver faz mais, e tu hoje nem esse ‘chalme’ possui, como teu primo salgadinho, nele não há passantes alheios ou silenciosos, lá o mesmo gaiato solta um grito fanho que não te pertences.


És um fantasma que nas suas trevas, clama silencioso por um passante em tuas calçadas. Nas sombras das portas cerradas só refletes tu, horrenda, com tua luz amarelada. Sorrisos apenas nos outdoors queimados que tu carregas. Ó profundeza de teus bueiros entupidos, como pedir que lance teus anúncios, santinhos e panfletos entalados, para quem sabe assim poder expressar algo. - Nem fossem saudades. Se já nem vives mais Avenida Fernandes Lima, como te pedir para regurgitar?


Te evitam sempre que podem: Seja pelo Bebedouro dono de ladeiras ébrias ou pelo lado daquela que foi jocosamente apelidada de Via expressa. Evitamos-te sempre que podemos, velha carola que se recolhe ao anoitecer. Quando muitas vezes necessária, evitamos mirar suas órbitas vazias e seu sorriso banguela. Pois é um fantasma, arremedo que insiste se chamar avenida. Tu que morreste de diabetes em teu hospital de açúcar. Participamos alheios de teu cortejo diário.


Ser cadavérico abdique da mesquinhez do teu imenso tumulo, onde jaz o tal quartel, tão grande e tão igualmente inútil. Suspire um último alento que seja para o verde de teu Ibama e escancare seus portões lacrados, para que crianças subam em suas árvores ou te roubem pitangas; não vista esse manto falso de bom vizinho, permitindo que caminhemos em teus meios fios por nome de calçadas. E se não, que toupeiras gigantes, façam jus a suas carteiras de corretores, te fazendo buracos e erguendo novos velhos hipermercados. – Como os que estas acostumadas.


Como te chamas hoje?


Lembra-te que hás de morrer também esse teu nome, e serás rebatizada com outro pomposo, que bem representa tua atual desgraça, por hora livrastes de se chamar: Avenida Fernando Collor. Seria pior assim tua ruina, não seria? E infelizmente, essa é tua cruz nesse lugar onde tu estas enterrada, chamar-se assim ou: Avenida Renan Calheiros. Não duvide da capacidade desses que vôs habitam e que vôs desgovernam. Disso não escaparas, nem tu e muito menos nós, que teríamos assim de repetir esses nomes vis, até cairmos numa letargia perante os feitos desses cães.


Livrai-nos (por hora) desse mal,

Amém.

Cid Brasil

Nenhum comentário:

Postar um comentário